Great Highland Bagpipe
ou Phiob Mór
Highlands, Escócia
Escócia
A Great Highland Bagpipe (conhecida em
Português como "Gaita Escocesa" ou "Gaita-de-fole Escocesa"), é talvez a
mais conhecida de todas as gaitas-de-fole.
Isso deve-se sobretudo à grande popularidade que esta goza no mundo
anglo-saxónico, resultado da influência dos meios de comunicação e
produções cinematográficas de países como os Estados Unidos da América,
por exemplo, que a celebrizaram por todo o mundo, sobretudo incluída em
bandas militares.
Apesar de estar conotado com as Terras Altas da Escócia, este
instrumento está difundido nas ilhas britânicas e em praticamente todo o
mundo, especialmente nas ex-colónias ou protectorados do Império
Britânico - como o Paquistão ou a Índia, por exemplo, que são
fabricantes em massa deste instrumento - e também na Nova Zelândia,
Austrália, Estados Unidos da América, Irlanda e Canadá, bem como no
Médio Oriente e Sudeste Asiático.
Isso deve-se em grande medida à inclusão de bandas militares de
gaiteiros escoceses nas fileiras do exército do Império Britânico (a
partir do século XVIII), que viajava por todas as colónias. A fama quase
internacional da GHB, assim adquirida, acabou por fazer com que uma
grande parte de um público menos informado ache que é a única
gaita-de-fole existente no mundo, que esta é "superior" às outras ou até
que todas as outras gaitas-de-fole "descendem" deste modelo ou que
tiveram origem na Escócia - nada disso é verdade.
Na realidade, a Great Highland Bagpipe é apenas uma das muitas formas
que o instrumento gaita-de-fole assumiu em todo o mundo e não é nem
superior, nem inferior a qualquer outro instrumento do género; é
simplesmente diferente. A sua extensão musical, por exemplo, nem sequer
é muito abrangente, com apenas praticamente uma oitava de gama e algumas
alterações.
Uma banda militar
escocesa, a imagem mais conhecida da Great Highland Bagpipe
Não se sabe quando e como terá surgido a gaita-de-fole na Escócia,
embora se presuma que terá sido muito popular por toda a Europa durante
a Idade Média e que talvez se possa datar daí a sua introdução (a
ausência de fontes anteriores não permite especular muito mais).
Chamar à Great Highland Bagpipe "gaita escocesa" não é inteiramente
correcto, pois existem na Escócia muitos outros tipos de gaitas:
Scottish Smallpipes, Lowland Pipes, entre outras.
Por outro lado, o instrumento com as características que conhecemos
hoje, (a Great Highland Bagpipe) é muito recente.
A versão mais antiga de que há registo só possuía um único bordão tenor,
de curtas dimensões, a que foi adicionado outro idêntico por volta do
século XVI.
Apenas no século XVIII foi acrescentado um bordão baixo, formando a
configuração actual.
O tubo melódico, com a afinação e o timbre actuais, também só surgiu por
volta dessa época e sofreu grandes transformações até hoje, apresentando
grandes diferenças face aos modelos mais antigos.
O modelo fotografado (ver primeira foto
acima) foi fabricado na Escócia com materiais sintéticos recentes, de
que constitui exemplo o fole em Gore-Tex - uma fibra têxtil sintética -
e o tubo melódico em Polypenco (plástico). Os restantes tubos sonoros
foram construídos em madeira de ébano. O tubo melódico ("chanter") tem a
tonalidade de Sib, enquanto que os bordões baixo ("bass drone") e
tenores ("tenor drones") estão afinados na mesma tonalidade, mas duas e
uma oitava abaixo do tubo melódico, respectivamente.
A digitação da Great Highland Bagpipe é "semi-fechada"; ou seja, para
certas notas levanta-se apenas o dedo situado no buraco da nota a
emitir, enquanto que noutras se levantam dois ou mais dedos.
De referir que o intervalo entre a tónica e a subtónica do ponteiro da
Great Highland Bagpipe é de um tom inteiro, em vez de meio tom - o que
se deve ao facto de a Great Highland Bagpipe estar afinada no modo
Mixolídio (dois semitons situados do 3º para o 4º e do 6º para o 7º
graus a partir da tónica).
Um vídeo de uma
banda militar escocesa ("Pipe Band"), num dos muitos
campeonatos ("Tatoos") organizados em torno destas formações, na
Escócia.
A influência da Great Highland Bagpipe
O Império Britânico foi o principal veículo de divulgação e expansão da
Great Highland Bagpipe e das bandas militares escocesas ("Pipe Bands"),
hoje conhecidas em todo o mundo.
Por outro lado, a cultura anglo-americana, que tem uma forte presença
nos meios de comunicação mundiais, deu muita visibilidade às bandas
militares escocesas e levou a que, um pouco por todo o mundo, várias
culturas as tentassem imitar, particularmente nos países anglófonos
(E.U.A., Nova Zelândia, Austrália, Canadá) e em países que foram
ocupados ou colonizados pelo Império Britânico:
Índia e
Paquistão
Banda
indiana de formato escocês.
Os maiores fabricantes de Great Highland
Bagpipe não estão, como se poderia pensar, nas Ilhas Britânicas, mas na
Índia e Paquistão, países que fizeram parte do Império Britânico e que
foram ocupados pelo seu exército.
Nestes países são muito comuns as bandas criadas à imagem das bandas
militares escocesas e há famílias inteiras que se dedicam à construção
massificada de gaitas deste tipo, em más condições de trabalho e com
rendimentos muito baixos - o que produz instrumentos em grande número,
extremamente baratos, mas considerados de má qualidade pelos gaiteiros
escoceses.
É frequente que também nestes países sejam celebrados "Tatoos"
(campeonatos de bandas) à imagem do que sucede na Escócia, mas com
bandas locais.
Para além da Índia e Paquistão, outros países colonizados pelo Império
Britânico mantêm instrumentos e formações musicais deste género, como é
o caso do Médio Oriente (Palestina, Síria, Jordânia, Iraque, Arábia
Saudita) e até, no Sudoeste Asiático, a Malásia e Singapura.
Bretanha
Francesa
Uma "Bagad"
bretã com Great Highland Bagpipe.
Na Bretanha, no noroeste da França, imitaram
recentemente o formato da banda militar escocesa, (em bretão; "Bagad"),
a partir de 1944, quando aí se encontravam estacionados vários
regimentos militares britânicos (que incluíam bandas militares
escocesas) no final da Segunda Guerra Mundial.
As "Bagad" adoptaram directamente a Great Highland Bagpipe, à qual
chamaram "Biniou-Braz" ("A Nova Gaita" em Bretão), para a diferenciar
das gaitas bretãs originais, como o Biniou-Koz
("A Gaita Antiga") e a Veuze.
Também é frequente que as "Badag" incorporem alguns Biniou e Bombardas,
a par com um grande número de Great Highland Bagpipe.
Apesar de nos anos 70 e 80 as "Bagad" conhecerem um período de grande
expansão, hoje assiste-se a um movimento que procura revitalizar o
Biniou e a Veuze bretãos, que quase foram substituídos pela Great
Highland Bagpipe (o que parece paradoxal, numa região com práticas
musicais muito fortes à volta das gaitas-de-fole autóctones).
Galiza
(Espanha)
Um
exemplo de "Banda Marcial", com gaitas,
percussões e até um bastão, decalcados das
bandas militares escocesas.
Na Galiza (Noroeste de Espanha) no final dos
anos 80, principiaram a surgir as "bandas marciais", grupos musicais que
copiaram o formato das bandas militares escocesas, usando as mesmas
percussões e estilos coreográficos; estas bandas usam por vezes um tipo
de instrumento que foi baptizado de "gaita marcial", uma gaita
modificada para imitar a Great Highland Bagpipe (no formato do fole,
dimensões e disposição dos tubos sonoros). Também é frequente que se
celebrem campeonatos de bandas, decalcados dos "Tatoos" de bandas
escocesas, desde 1990. Estas formações conheceram uma grande expansão,
devido ao pesado financiamento providenciado pelo poder local, o que tem
gerado protestos por parte da comunidade de músicos galegos, que se
considera subfinanciada e preterida nos apoios. A Galiza tem conseguido
preservar, no entanto, uma riqueza e antiguidade impressionante de
instrumentos autóctones (sobretudo de gaitas
galegas) e uma comunidade muito activa de excelentes músicos e
investigadores que não se submeteram ao modelo das bandas militares
escocesas. Existem inclusivamente bandas de gaitas que usam apenas
gaitas e percussões autenticamente galegas.
Astúrias
(Espanha)
Uma
gaita asturiana, dificilmente reconhecível, depois de ter sido
transformada para imitar a morfologia da GHB.
Nas
Astúrias (Noroeste de Espanha), por influência da introdução do formato
escocês na vizinha Galiza, também o movimento de imitação das bandas
militares escocesas teve alguma expansão.
O modelo de instrumento utilizado também foi manipulado para se
assemelhar à Great Highland Bagpipe, com a modificação da tonalidade e
morfologia de gaitas asturianas, no
formato do fole, da posição dos bordões e dimensões das peças.
As percussões utilizadas nessas formações também são iguais às
utilizadas nas bandas militares escocesas (por vezes, são mesmo
importadas directamente do Reino Unido) - apesar de as percussões e
gaitas asturianas autênticas serem muito diferentes.
Tal como na Galiza, nas Astúrias existe uma comunidade de músicos que se
dedica a explorar a riqueza própria da cultura musical asturiana
(sobretudo das possibilidades da Gaita Asturiana) e dentro da qual o
modelo das bandas militares escocesas ou da Great Highland Bagpipe é
considerado uma mera cópia de modelos exteriores.
Texto: Miguel Costa (Associação Gaita de Foles), 2004 - Direitos Reservados